Tradução: Graça Salgueiro
Enquanto o presidente Santos e seu escudeiro, o congressista Roy Barreras, defendem à capa e espada o pouco claro e não muito convincente projeto denominado “marco legal para a paz”, a Colômbia inteira está desinformada e, portanto, carece de certeza em torno dos alcances deste projeto de lei, da intenção pessoal de Santos, de qual é a leitura que as FARC dão a esta oferta governamental e do que é que de maneira específica Santos negociará para alcançar seu objetivo.
Por razões óbvias, os membros de todos os graus das instituições armadas olham com reservas esta situação. A realidade objetiva é preocupante. Nos processos de paz com grupos terroristas latino-americanos em El Salvador e Guatemala, os respectivos governos cederam a todas as petições dos delinqüentes frente à redução das tropas, à responsabilidade penal dos militares e à absolvição total dos integrantes dos grupos delitivos.
Os fatos parecem indicar que a única coisa negociável para os governantes tem sido a diminuição das tropas com conseqüências jurídicas e de bem-estar social imprevisíveis, além da orientação das “comissões da verdade” para crucificar os militares e salvar todo tipo de responsabilidades dos terroristas. Finalmente, a inexplicável experiência colombiana com o M-19 constitui um nefasto antecedente.
Nenhum cidadão honesto, nem nenhum militar ou policial, poderão entender jamais como é possível que, enquanto o general Arias Cabrales e o coronel Plazas Vega se encontrem reclusos por ter salvado a República em uma de suas horas mais funestas, terroristas como Petro, Navarro Wolf, Bustamante, Vera Grave, ex-integrantes do grupo criminoso, agora são “honoráveis” dirigentes políticos?
Se continuar com essa tônica, as FARC e seus cúmplices, causadores de aterradores atos de barbárie, narco-terrorismo e violência sistemática, serão governantes, promotores, embaixadores, ministros, governadores, prefeitos, enquanto os que evitaram nos campos de combate que esses criminosos triunfassem, serão ajuizados, vilipendiados e desonrados. É o mundo ao revés.
Ao longo da vida republicana, a direção civil viu as Forças Militares como um mal necessário. A prova disso é que durante o século XIX fez carreira o estribilho: “A Colômbia é um país de coisas singulares. A guerra a fazem os civis e a paz os militares”.
Ademais, as crises nas relações civis-militares têm demonstrado que a direção política desconhece, ignora e se despreocupa com a fundamentação na defesa nacional, ao mesmo tempo em que, por doutrina interna, os militares desconhecem e de contrapeso, não se preocupam em conhecer a política.
Devido a isto, a população civil colombiana é induzida a pensar que a guerra é um problema entre militares e terroristas, que a paz é um assunto do presidente com os cabeças das FARC ou ELN e que o resto dos colombianos são “pessoas civis alheias ao conflito”.
Nem o alto governo, nem os dirigentes regionais, nem as administrações municipais, nem as Cortes, nem o Congresso da República, parecem se dar conta de que está em andamento uma agressão integral das FARC, sustentada em um Plano Estratégico com componentes políticos nacional e internacional, atividades sociais com ONGs, finanças com o narco-tráfico, o seqüestro, a extorsão, e nexos com os governos pertencentes ao socialismo do século XXI, o Foro de São Paulo e os nexos com organizações narco-terroristas como ETA, Al-Qaeda e IRA.
Não obstante essa realidade, a curta visão político-estratégica de sucessivos governos nacionais refletiu-se na resposta militar sem entender o Plano Estratégico das FARC, nem evidentemente articular uma estratégia política, jurídica, diplomática, psicológica e de desenvolvimento sócio-econômico nas zonas onde as guerrilhas operam.
À sua maneira, cada governo anunciou com bandas e fanfarras, a iminente destruição das guerrilhas comunistas. Como ministros da Defesa, Pardo Rueda e Martha Ramírez lhes deram 18 meses de vida; o general Padilla De León prognosticou a aproximação do fim do fim; o ex-ministro Rodrigo Rivera predisse que a morte de Jojoy seria o fim das FARC.
E assim sucessivamente, o triunfalismo que hoje Santos encarna graças ao sacrifício das tropas não a uma estratégia nacional, pois esta não existe, opaca a realidade de uma guerra que dilacera o pais, tem bem uns poucos mas afasta a cada dia a possibilidade de que as comunidades afetadas pela presença de bandos narco-terroristas tenham a oportunidade de se incluir no esquema de desenvolvimento integral do país e a conseqüente saída do atraso.
Para cúmulo dos males, os governos de turno, sem exceção, têm demonstrado que eles estão dispostos a “negociar a paz” sem importar o custo que as Forças Militares tenham que pagar.
Custo materializado em abandono jurídico de quem defendeu a erodida democracia, péssimos salários, flagrante descumprimento das obrigações salariais legais do Estado estabelecidas para os militares desde 1992, inadequado e ineficiente serviço de saúde militar, insuficiência de casas fiscais, vulnerabilidade e politicagem com o foro militar, ambigüidade com o regime disciplinar e o que é mais grave, ausência de clareza dos governos para enfrentar o inimigo da Colômbia em todos os campos de suas ações subversivas.
Mesmo que o governo nacional e o ministro da Defesa queiram negar a realidade ou tapar o sol com um dedo, ao sobrepor seus interesses políticos pessoais sobre os objetivos nacionais e a adequada concepção da segurança nacional, há uma palpitante realidade:
Circula uma preocupante corrente de decepção e desconcerto entre os integrantes das Forças Militares ante a atitude ambígua, oportunista e politiqueira de Santos, pois em seu descomunal Ego o mandatário crê que pode utilizar os êxitos das tropas para tirar dividendos re-eleicionistas, e inclusive aumentar o tamanho das tropas sem suficientes quadros de comando, uma onda de desconcerto e incerteza procura nichos nas unidades onde aterra a ausência de foro militar, péssimos salários e manifesta deslealdade da direção política.
Esse é um problema muito sério que demanda respostas político-estratégicas, soluções concretas para problemas sentidos de saúde, salários, defesa jurídica, foro militar, regime disciplinar, representação profissional em todas as áreas das atividades militares, etc., junto com soluções sociais, econômicas e políticas aos problemas das comunidades afetadas pelo complexo entorno estrutural do narco-terrorismo.
Não basta o argumento da estratégia militar da Espada de Honra, cujos resultados foram ótimos, pois o problema não é somente militar. Além disso, os soldados nunca falharam em cumprir sua missão. O problema é antes social, político, econômico e cultural.
Portanto, sua solução requer ações político-estratégicas conjuntas. Não só respostas militares com tropas mal representadas no campo político, mal pagas, sem respaldo jurídico e, além disso, sem confiança em um mandatário que um dia fala em dar chumbo aos bandidos e no outro dia dá sinais de estar negociando com as FARC uma enredada paz que além de afetar os interesses vitais da institucionalidade, terá como premissa desarticular as mesmas Forças Militares que o levaram e o têm protegido no poder.
É necessário atuar, antes que o problema cresça e que seja demasiado tarde. Os militares não podem ficar sós nesta guerra, nem o establishment pode esquecer que é graças às tropas que a institucionalidade subsiste, nem o presidente Santos pode pensar que seu governo chegará à paz sem estratégia integral, sem planos coerentes e sem o fortalecimento em todas as ordens, tanto das Forças Militares quanto dos programas de desenvolvimento sócio-econômico nas zonas de operações contra o terrorismo, para evitar a incorporação de novos integrantes às quadrilhas das FARC, do ELN ou dos bandidos das bacrim.
A solução para o problema nunca pode ser a negociação claudicante e sem consulta das Forças Militares, em nenhum aspecto. Muito menos em pensar que os bandidos que não entrarem na partilha da torta burocrática se integrarão às tropas regulares. Tampouco é uma etérea lei de paz ao estilo da impulsionada por Barreras. O primeiro passo para a solução é desenhar uma estratégia nacional coordenada e coerente como Política de Estado a longo prazo.
* Coronel Luis Alberto Villamarín Pulido
Analista de assuntos estratégicos